Minha Grande Hipocrisia
Sou mesmo feminista?
– Tá errado isso daí. – Declarei, interrompendo a apresentação com um sorrisinho maroto nos meus lábios, daqueles que você faz quando sabe que está numa posição superior e que a moral é inteiramente sua.
A sala parou. Meus pés estavam em cima da mesa, minha mão rabiscando estrelas num papelzinho com uma caneta, postura típica de quem não está prestando atenção, de quem não liga.
– Não foi a Colômbia que apoiou o regime de Maduro. Foi a China. A Maria está errada.– Explanei, sem tirar os olhos do papel.
Senti os olhos em cima de mim, inquietos, ansiosos para ver como o resto da reunião correria. Mal sabiam eles que não ia falar mais nada. Queria apenas arriscar um olhar pra Maria e ver sua expressão. Estaria tremendo? Chorando? Confiante? Minha curiosidade pressionava a ponta da caneta e minha próxima estrela ficou bem mais grossa que a outra. De repente, arrisquei. Ela estava em pé, com as mãos juntas na sua frente, dentes cerrados.
– Ah… desculpa. D-d-depois arrumo isso…– Disse. Sua voz trêmula.
Não respondi. A reunião continuou. Mas, sabia que minha presença estava clara, minha autoridade sobre ela consolidada. Desenhei estrelas maiores.
Trinta minutos depois, acabamos. Todos se ergueram, pegaram seus pertences e saíram da sala. Estava quase chegando à saída quando percebi que havia esquecido minha caneta. Voltei a tempo de ouvir a voz de Maria falando com a professora:
– Não quero fazer isso de novo… –
Parei.
– Acho que é melhor eu sair da liderança. Claramente não sou boa o suficiente. –
Virei os pés e corri.
Eu cresci com mulheres fortes. Algumas eram fadas, outras princesas: uma avó que foi obrigada a reconstruir sua vida numa cidade nova após o abandono do seu marido; uma mãe cujo espírito aventureiro levou sua família a dois países diferentes… Umas eram reais, outras viviam apenas enquanto meus dedos viravam as páginas que continham suas estórias. Todas tinham a independência e a persistência que eu admirava, que me faziam sonhar alto demais e me inspirar em figuras, como Cleópatra e a Rainha Elizabeth I. Lia tanto sobre elas que tinha a audácia de me achar minimamente parecida, mas foi aí, enquanto corria, que percebi o quão errada estava.
Todas essas mulheres, vivas ou mortas, reais ou fictícias, conseguiram, de alguma forma, me inspirar a ser alguma parte da pessoa que sou hoje. Do mesmo jeito que as ídolas de todos também conseguem. Mesmo assim, ao invés de ajudar a outras meninas, como Maria, em momentos de crise, optei por me colocar acima. Percebi que não fui, nem serei a única a fazer isso.
Nós, mulheres, temos esse costume. Somos as primeiras a falar mal da outra, a olhar feio, a desejar o mal… É fácil ser a favor do feminismo. É fácil idolatrar uma grande mulher na sua vida. Mas, qual é o nosso papel nesse movimento? Só isso? Só acreditar? Foi esse o pensamento que me tirou do sono. Sou líder de Femolution; participo das marchas das mulheres na Avenida Paulista; admiro as amigas que escolhi e tento apoiá-las da melhor maneira possível… Mas, e o resto? E as meninas que não são minhas amigas próximas? Por que o sentimento para com elas é tão diferente?
Existe aquela frase: “Mulheres empoderadas empoderam outras mulheres”. No Dia Internacional da Mulher, ela aparecia em tudo quanto é canto, stories no Instagram, etc. Mandamos mensagens umas às outras, fazemos declarações de admiração… Mas, no dia seguinte, o WhatsApp já estava cheio de mensagens falando da “Joana” na festa de sábado. Falamos dos homens; mas, e a gente?
O feminismo não funciona se apenas acreditamos na igualdade dos gêneros, se só participamos de passeatas, se só discutimos com pessoas que pensam diferente, se só nos inspiramos em mulheres como Simone de Beauvoir. Tudo isso é inútil. Completamente inútil. Se somos incapazes de apoiarmos umas às outras, seja na sala de aula, na festa do “Rodrigo”, ou, até mesmo, no próprio Instagram.
Essa foi minha grande hipocrisia. Provavelmente não foi a primeira vez que aconteceu, nem será a última. Mas, acredito que as soluções começam a partir da percepção.
E, aí? Vamos ser MESMO feministas?
During her third and final year on The Talon, Gabi continues to believe in living life intensely. Frequently described as “crazy” she seeks adventures...